Construir abrigos e espaços adequados ao trabalho humano é parte fundamental do processo evolutivo de nossa sociedade. Sendo assim a construção civil passou por uma enorme transformação, desde as construções em pedra, passando pelas obras em madeira, concreto, tijolos e metal, até chegar aos dias de hoje com construções de grande tecnologia que permitem a execução de edifícios com centenas de metros de altura e com grandes extensões de vãos.
Ao longo desse processo, não apenas a evolução dos materiais utilizados para a construção civil foi importante como também o desenvolvimento de técnicas capazes de criar padrões construtivos que possam ser reproduzidos em diferentes locais. Nesse sentido, a padronização das peças e dos componentes da construção civil tem papel fundamental na criação de edificações de acordo com as necessidades de seus usuários, ainda que possam ser executadas com precisão e qualidade técnica.
Quando se pensa em construção civil no país, geralmente se associa a uma visão de que é feita in loco (no próprio local onde deve ficar o edifício), salvo casos de edificações pré-fabricadas. Mas a verdade é que o processo de construção se inicia muito antes do canteiro de obras! Sim, o processo tem início com a extração de matéria-prima e o processamento dela dentro de indústrias de base, posteriormente passando por indústrias que processam a matéria resultante e a transformam em um componente que pode então ser enviado ao canteiro de obras.
Os componentes do edifício vão desde o concreto usado para a estrutura, os tijolos assentados para uma parede até as portas que conectam os ambientes internos ou, ainda, a cerâmica usada como revestimento. Para que a construção possa acontecer de maneira adequada, é importante que esses componentes sejam feitos de maneira precisa e padronizada.
Assim a construção civil no Brasil necessita que seus componentes sejam feitos em indústrias, seguindo determinados padrões dimensionais e de qualidade, ainda que grande parcela das obras seja feita em canteiros de obras.
Essas indústrias que transformam matéria-prima em componentes voltados a atender a construção civil são fundamentais para que o setor possa seguir crescendo e se tornar, ano após ano, mais eficiente. Assim, esse tema será objeto de estudo ao longo deste primeiro capítulo, uma vez que a qualidade e a precisão desses componentes acabam sendo determinantes para a qualidade das obras civis em todo o mundo.
Para que seja possível entender mais sobre os componentes utilizados em canteiro de obras para a criação de verdadeiras obras de arte construídas e utilizadas como habitação, espaços de trabalho ou de lazer pelo homem, é necessário entender dois conceitos importantes, que são:
A modulação em arquitetura pode ser entendida como a adaptação de um projeto a uma unidade de medida dimensional que é determinante para a composição de um todo, podendo ser definida a partir de uma unidade de medida básica, tal como uma unidade em metros, ou pela medida de um elemento que compõe o todo, tal como os tijolos, ou, ainda, um contêiner usado na criação da edificação (SOUZA, 2020). Portanto o módulo é uma unidade utilizada na parametrização de projetos de edificações, facilitando sua execução e possibilitando uma obra mais racional e que, consequentemente, gera menos desperdício e resíduos.
Inicia-se, já nos tempos antigos, desde a construção das pirâmides, com o processo de encaixe de pedras cortadas na dimensão correta para a adequada colocação ou assentamento, passando pelos templos gregos, pelas cidades romanas ou, ainda, pelas construções japonesas, utilizando a medida de um tatame como módulo para a construção de casas (GREVEN; BALDAUF, 2007).
Os templos gregos antigos podem ser vistos como obras-primas da matemática, uma vez que utilizavam cálculos que determinavam as proporções e a harmonia das partes que compunham o todo. Assim, como exímios conhecedores de matemática, os gregos utilizavam a “secção áurea” para os cálculos de proporção entre as partes que compunham seus templos. Além de calcular as dimensões de cada parte que compõe o todo de um templo, era possível que grandes blocos em pedra fossem esculpidos com precisão e riqueza de detalhes.
Apesar de ser possível esculpir cada bloco de pedra que seria utilizado para compor uma coluna grega, por exemplo, esse processo ainda era feito de modo manual, por meio de homens treinados para o trabalho de cantaria, sendo plausíveis de pequenas falhas e defeitos provenientes do trabalho manufaturado.
Esse processo manual de execução de componentes inicia-se nos primeiros assentamentos humanos e se prolonga na história humana até um grande acontecimento nos séculos XVIII e XIX – a revolução industrial.
Assim é possível dizer que o conhecimento dos conceitos de modulação vem desde tempos antigos, pois utiliza dados matemáticos como base, adotando uma medida unitária e a utilizando repetidamente, sendo a dimensão final do edifício uma soma de cada componente unitário que o compõe.
Já os processos de execução de peças modulares de grande precisão podem ser vistos como um processo mais recente, visto que se aprimoram com o desenvolvimento de máquinas capazes de reproduzir determinados padrões e criar peças em série de mesmas características físicas e dimensionais.
A revolução industrial foi um grande marco para o desenvolvimento econômico e social. Iniciada em meados do século XVIII na Inglaterra, os processos de industrialização são determinantes para as mudanças que acontecem no decorrer dos próximos séculos na construção civil, visto a capacidade de produzir componentes de forma seriada.
A necessidade de criar espaços de trabalho que comportem as novas atividades, tais como ferrovias, grandes barracões industriais, pavilhões de exposição, armazéns, portos, dentre outros, surge a partir desse período da história.
Eles são determinantes para que a indústria desenvolva processos de produção de componentes em vidro, ferro e cerâmica em larga escala, dando o pontapé inicial para os processos de produção industrializada de matéria-prima para a construção civil, que antes era feito de forma manufaturada e em pequena escala.
Esse processo então permite que novas arquiteturas possam surgir, tais como aquelas citadas acima. Podemos citar como exemplares importantes da época a icônica Torre Eiffel, em Paris, e o Palácio de Cristal, na Inglaterra, datado de 1851, podendo ser considerado como a edificação que iniciou o processo de fabricação modular voltado à construção civil. O Palácio de Cristal, de autoria de Joseph Paxton, foi utilizado para a primeira exposição industrial internacional, em Londres.
Montagem e desmontagem
O Palácio tinha como premissa que a edificação pudesse ser desmontada, a fim de que pudesse ser remontada e reutilizada em outros locais após a feira. A fabricação e a montagem em peças modulares em ferro e vidro no prazo recorde de nove meses só foi possível devido ao nível de detalhamento das peças e ao seu processo de fabricação em indústrias especializadas.
Esse princípio de montagem e desmontagem é importante ainda hoje na construção de diversas edificações de caráter temporário, como é o caso do Estádio 974 no Qatar, projetado para a Copa do Mundo de 2022. O estádio foi feito exclusivamente com mais de 44 mil contêineres e barras de aço. Esse projeto pode ser desmontado e remontado em outro local ou ainda ser remodelado para abrigar outros usos, seguindo a mesma premissa de coordenação modular aplicada às edificações já nas primeiras feiras internacionais (FLORIAN, 2023).
Nesse sentido, a construção modular e a criação dos componentes pelas indústrias se tornam importantes premissas adotadas na construção civil a fim de reduzir o tempo de obra, bem como de matéria-prima para a construção. Inicia-se, assim, o desenvolvimento de técnicas construtivas a seco, ou seja, que possam ser montadas no local de obra, mas que sejam fabricadas fora do canteiro de obra – em indústrias especializadas.
Esses processos de modulação e uso de componentes industriais encontram campo fértil dentro da escola modernista de arquitetura, motivados pela grande demanda de reconstruir a Europa no período entre e pós-guerra. Arquitetos como Walter Gropius e Le Corbusier têm destaque na aplicação e no desenvolvimento da concepção de projetos modulares em suas obras.
Le Corbusier desenvolveu um estudo das proporções humanas por meio do Modulor, e ainda criou a Maison Dom-Ino, protótipos para uma casa que deveria se assemelhar a um jogo de dominó, onde as peças pudessem ser encaixadas, de modo que a casa pudesse ser replicada em diferentes locais. A Maison Dom-Ino pode ser estudada ainda hoje como um interessante protótipo para criação de estruturas de edificações de planta livre, desde pequenas casas até edifícios em altura.
Em 1936, Alfred F. Bemis desenvolveu uma teoria de coordenação modular voltada a aplicação em edificações que é, ao mesmo tempo, pensada a partir das necessidades da indústria, possibilitando uma melhor interação entre a fabricação e o canteiro de obras (GREVEN; BALDAUF, 2007 apud ROSSO, 1976). A dimensão do módulo pensado por Bemis era de 4 polegadas, dando início aos estudos de unidades básicas modulares aplicadas à construção civil nos Estados Unidos e, posteriormente, sendo usada como base para que outros países pudessem definir dimensões padronizadas para a coordenação modular dentro de suas indústrias voltadas à construção civil.
A partir dos estudos iniciados por Bemis, os países passaram a adotar uma medida como módulo-base. A modulação adotada em grande parte dos países é a de 10 centímetros, especialmente os países que adotam a medida métrica, como o Brasil. Essa definição e padronização só foi possível graças a diversas convenções iniciadas a partir dos anos 1940, especialmente da ISO (International Organization for Standardization).
Hoje, o uso do módulo-base para as indústrias da construção permite um intercâmbio industrial e o favorecimento da balança comercial, com a exportação e a importação de componentes da construção civil. Vale lembrar que os Estados Unidos e a Inglaterra são uma exceção, já que esses países adotam a medida de 4 polegadas (aproximadamente 10,16 centímetros) como unidade base para o módulo, já que não adotam a unidade métrica.
A partir dessa medida do módulo base, são então feitos os componentes industriais que são utilizados nas obras civis do país.
Assim, se pensarmos nos componentes utilizados para a construção, todos aqueles que não são moldados in loco ou feitos sob medida devem seguir esse padrão dimensional a partir da modulação base.
Devido ao Brasil adotar a modulação de 10 centímetros na fabricação de componentes da construção civil, é possível que suas indústrias possam atender tanto ao mercado nacional como também ao internacional, exportando produtos de ponta para países da América Latina, da Ásia e com destaque para a Europa. Como é o caso da indústria nacional de portas prontas, pois todo o material já vai pronto para a instalação, com excelente acabamento de pintura, usinagens e já fixadas às fechaduras e às dobradiças, devido à qualidade de seus produtos e à grande tecnologia aplicada em sua fabricação.
É sabido que, no Brasil, apesar de grande parcela das construções ainda serem feitas por meio de processos de construção manuais, é possível perceber que a participação da indústria da construção civil é capaz de reduzir tempo, custos e desperdício em obra, tornando-a mais eficiente.
Dessa maneira mesmo que toda construção seja feita in loco, uma grande parcela dos materiais utilizados é proveniente da indústria, como é o caso de kits de portas prontas para a instalação, que tem como vantagens a redução no tempo de instalação, a redução de resíduos provenientes de sua instalação, bem como uma grande precisão em sua instalação, garantindo que a vida útil da porta seja maior quando comparada à montagem de portas comuns e ainda maior em relação à qualidade de vedação acústica do conjunto.
Tabela 1.1 – Dimensão do módulo mínimo em diferentes países
Fonte: Adaptada de Greven e Baldauf (2007).
Até aqui vimos a definição de módulos, como a indústria da construção civil inicia o desenvolvimento de peças para a construção civil e de que forma a modulação é incorporada pela indústria. Vimos também o que é um módulo-base e quais as medidas que permitam a padronização nas peças fabricadas para a construção civil.
Durante o texto, em diversos momentos a palavra componente é utilizada, mas agora vamos entender melhor como todas essas informações convergem na criação dos componentes.
Seleção, correlação e intercambialidade. Esses são os três critérios base para que um componente seja considerado modular, segundo a ABNT (1975?) apud Greven e Baldauf (2007).
Assim os componentes são as peças unitárias fabricadas em série pela indústria e que vão para o canteiro de obras para sua construção ou montagem. Como vimos anteriormente, os países que utilizam a unidade métrica definiram uma unidade modular a fim de permitir a compatibilização entre os diferentes componentes utilizados em obra. Dessa maneira, por exemplo, um bloco de concreto tem dimensões adequadas para que seja montado sem a necessidade de recortes nas peças.
Isso tudo é possível graças à padronização dimensional por meio da unidade modular decimétrica. Consequentemente, isso permite que a indústria de componentes produza, por meio de processos automatizados e em série, criando componentes com as mesmas características dimensionais e que tenham intercambialidade entre si, ou seja, que sejam compatíveis com os demais componentes utilizados em obra.
Esse avanço permite uma indústria mais competitiva e, ao mesmo tempo, mais conectada, uma vez que há uma redução na variedade dimensional dos componentes e, ainda, um avanço de toda a cadeia produtiva, visto a possibilidade de a indústria trabalhar de maneira aberta, criando produtos de mesmas dimensões.
Nesse sentido, os diferenciais entre indústrias de um mesmo setor não acontecem por conta das características dimensionais, mas sim pelos materiais utilizados, acabamentos ou inovações tecnológicas de seus produtos.
Em suma, todo esse processo contribui para a qualificação da indústria do setor e pela competitividade e abertura para novos mercados internos e externos.
Mas já que se fala que a unidade modular é de 10 centímetros, por que os componentes industrializados geralmente não têm a medida múltipla dessa unidade? Como, por exemplo, os blocos de concreto são fabricados com largura de 39 centímetros?! Ou, ainda, a porta, que, apesar de ter a folha de 80 centímetros, vem com batente e alizares que podem atingir dimensões maiores do que o tamanho final do vão de abertura da porta?
Acontece que a dimensão dos módulos feita por unidades múltiplas de 10 centímetros deve ser considerada como medida final de obra. Assim um bloco de concreto, por exemplo, é fabricado pela indústria com dimensões padrões de, por exemplo, 14 x 19 x 39 cm (profundidade; altura; largura). Isso é explicado devido ao fato desses blocos não serem o objeto final, mas sim um componente para a construção de uma parede.
Dessa forma para que ele possa se transformar em parede, ele precisa ser assentado de uma maneira adequada, sendo necessário o uso de argamassa para seu assentamento, só assim é possível garantir uma parede estável e resistente! Por conta da necessidade de aplicar argamassa entre as peças, é importante que seja previsto o quanto de espaço esse material vai ocupar no vão entre as unidades do bloco.
A indústria prevê que o pedreiro utilize 1 centímetro de argamassa no vão entre as peças, fazendo com que a medida final do módulo seja então de unidades múltiplas de 10, ou seja, 20 x 40 cm (altura; largura).
Já a profundidade é determinada pela dimensão do emboço na face interna e na face externa da parede, assim os 14 centímetros podem ser transformados em 15, 16 ou mais centímetros.
Se, nos blocos de concreto, é preciso prever que a argamassa de assentamento vai ocupar esse 1 centímetro entre os blocos, no caso da porta, o que precisamos prever é que seja deixada uma dimensão de vão livre na parede maior do que o valor dimensional da folha acabada da porta, assim, em um caso de uma porta com a folha de 80 x 210 centímetros (largura x altura), é necessário que o vão livre seja de mais de 88 centímetros e que a altura de vão entre o piso acabado (não esqueça desse detalhe de considerar a altura do piso acabado, e não do piso “no osso”) e a verga seja maior do que os 215 centímetros de sua folha, a fim de abrigar os batentes e alizares da porta, a espuma expansiva para fixação.
Esses espaços deixados para o assentamento dos componentes são chamados de “ajustes modulares”, permitindo que se tenha uma relação entre os componentes e o sistema de dimensionamento modular, ou seja, uma pequena “folga” para que os componentes possam ser unidos entre si dentro do canteiro de obras. Para que isso seja possível, mais uma vez é importante ressaltar a necessidade das indústrias em criar componentes com dimensões idênticas e que possam ser compatíveis entre si (GREVEN; BALDAUF, 2007).
E agora vamos à parte importante para os profissionais responsáveis pelo projeto de edificações: como pensar em projetos a fim de reduzir a quebra de materiais e aumentar a produtividade da construção civil?
Uma possível resposta curta é: utilizando a modulação de projeto! Mas se fosse possível resolver problemas complexos apenas com respostas curtas, não existiriam tantos livros sendo lançados todos os anos.
Pois bem, a modulação de projeto por muitas vezes não recebe a devida atenção que deveria dentro das universidades, cursos técnicos e outros, e isso pode acontecer muitas vezes devido à indústria da construção civil no Brasil ainda ser baseada em uma produção manufaturada – o que acarreta obras de baixa produtividade, grande número de problemas durante a construção e, ainda, uma considerável geração de desperdício, mesmo utilizando componentes industrializados de medidas modulares.
Assista ao vídeo a seguir e entenda os desafios da construção civil no país.
O primeiro princípio da modulação é utilizar para a edificação medidas múltiplas da unidade mínima modular que, conforme vimos anteriormente, no caso do Brasil, é de 10 centímetros. Assim caso seja necessário adaptar um projeto, a primeira ação que pode ser feita é a de verificar suas medidas e compatibilizá-las com a unidade mínima modular, um bom exemplo é a modulação correta das medidas dos vãos de porta.
Veja, a seguir, o exemplo demonstrado por Hammarlund e Josephson (1992) por meio do Gráfico 1.1.
Outra ação para modulação e racionalização de projeto é criar uma malha modular em projeto. A malha modular consiste em uma grelha, formada por eixos de abscissas e ordenadas (horizontais e verticais) que possam seguir um ritmo determinado por uma medida-base ou por algumas medidas-base, criando assim como que um quadriculado onde a construção é projetada. É como imaginar uma folha quadriculada onde é recomendado que as paredes sejam desenhadas nas linhas do quadriculado e que os espaços em branco sejam usados como os ambientes desse projeto.
Seria possível criar uma malha com medidas de 3 metros entre eixos, 5 metros entre eixos, 10 metros entre eixos, dentre outros, desde que sejam múltiplos da unidade base de 10 centímetros. Ou, ainda, caso não seja possível que todo o projeto se ajuste a um módulo de 5 metros, por exemplo, os eixos podem seguir um ritmo determinado por duas ou mais medidas entre eixos, com eixos que tenham distância de 5 metros e, caso haja necessidade, eixos com medidas não múltiplas diretas dessa unidade, como 2 ou 3 metros.
Um projeto interessante para se entender o conceito da criação de malhas é o projeto do escritório de arquitetura FGMF, a Casa Grelha, que foi pensada a partir de módulos de 5,5 x 5,5 metros (CASA, 2007).
Essa medida norteia o projeto de toda a casa, no entanto para os espaços de circulação se fez necessário uma redução dessa medida, visto que em uma casa não é necessário que se tenha uma circulação com mais de 5 metros de largura. Para as circulações – que, no caso dessa casa, são abertas – o módulo foi dividido ao meio, conforme pode ser observado na Figura 1.12.
Obviamente existem diversas maneiras de garantir que uma edificação será modulada. Mas aqui vale ainda destacar a utilização da modelagem computacional em BIM para o desenvolvimento de projetos mais racionais e alinhados ao uso de componentes para a construção civil.
É possível criar projetos em BIM inserindo, já no início de seu processo de desenvolvimento, os componentes industrializados disponíveis e que devem ser utilizados em obra, sabendo seus ajustes modulares, interações entre os mesmos e dimensões de encaixes. Dessa forma o risco de incompatibilidades em obra e de recortes nos componentes se reduz drasticamente.
Outro modo interessante para se reduzir as incompatibilidades e as interferências entre componentes é fazendo a compatibilização de todos os projetos que compõem a obra, dentre eles: arquitetônico, estrutural, vedações, esquadrias, elétrico, hidrossanitário, ventilação, dentre outros.
Tanto a criação de projetos já inserindo seus componentes assim como a compatibilização de projetos demandam maior tempo de projeto e, consequentemente, o tornam mais custoso em um primeiro momento para os projetistas, mas em contrapartida, os custos de obra são reduzidos drasticamente.
No entanto ainda que no início pareça desconfortável e mais trabalhoso o desenvolvimento e a adaptação de projetos para a modulação, quando os processos passam a ser incorporados pelos profissionais, é possível perceber uma simplificação em todo seu processo de criação, visto que pela padronização dos componentes e seus encaixes, os detalhes construtivos já estarão solucionados pela indústria previamente ao projeto. Como consequência, os profissionais do projeto podem ter mais tempo para o desenvolvimento de outros aspectos do projeto, como sua funcionalidade interna ou estética (GREVEN; BALDAUF, 2007).
Além disso por conta de os processos de construção estarem todos previstos em projeto, a montagem passa a não demandar o recorte de peças, permitindo maior agilidade, menor desperdício e garantindo a qualidade da obra por conta do maior grau de padronização dos componentes advindos da indústria.
Os componentes vão desde um módulo completo fabricado pela indústria – como um contêiner modificado para abrigar uma casa, até um pequeno componente usado como parte na construção – como um tijolo levado em milheiros para a criação de vedação no canteiro de obras.
A partir daqui, é possível perceber que temos duas principais vertentes dentro da construção civil: a moldada in loco e a pré-fabricada. A primeira, moldada in loco, apesar de receber componentes fabricados em uma indústria, tem o canteiro de obras como espaço principal de desenvolvimento da construção. Já a pré-fabricada tem como característica a execução em fábrica e, dentro do canteiro, acontece basicamente a montagem e a conexão desses grandes módulos.
Em ambos os casos, temos a indústria como espaço essencial ao desenvolvimento da construção civil. Mas no caso da indústria dos pré-fabricados, é primordial que todas as partes que compõe o módulo ou a unidade que deve ser levada pronta para a obra (tal como as portas prontas, um contêiner, ou como um módulo em wood frame ou steel frame, por exemplo) estejam compatibilizados e atendam às necessidades dimensionais do módulo, dessa forma as diversas indústrias que fornecem material para sua montagem precisam trabalhar de maneira síncrona, a fim de evitar incompatibilidades.
Já a indústria da construção in loco também utiliza componentes modulares, muitos dos quais são os mesmos utilizados na indústria do pré-fabricado, no entanto por essa indústria ser mais manual, muitas vezes acaba gerando demandas incompatíveis com os componentes vindos de fábrica. Exemplos disso são as portas, que ainda utilizam batentes chumbados e realizando manualmente a instalação das fechaduras e dobradiças, gerando quebra de material e desperdício na obra.
Outro exemplo são as portas instaladas em batentes chumbados com argamassa na alvenaria, ainda utilizadas em obra. Muitas vezes a folha da porta vem na dimensão modular de 60, 70, 80 centímetros, no entanto quando essa é feita diretamente no local, faz-se necessária a compra e o recorte de peças em madeira, PVC ou outros materiais para a criação de batentes e guarnição, gerando peças que podem ter baixo acabamento e que, além disso, geram recorte de material com desperdício em obra e aumento no tempo do profissional para a montagem dentro da obra.
Sendo assim é importante fazer uma reflexão a respeito dos motivos pelos quais em muitas obras ainda são utilizados métodos antigos de construção e montagem de componentes, mesmo que já tenhamos uma indústria capacitada a atender ao mercado de maneira precisa, com materiais de ponta, preço competitivo e incremento em qualidade do produto final, bem como redução de desperdício e mão de obra!
O caso das portas acaba por ser emblemático, uma vez que muitos profissionais da construção civil sequer sabem que existem produtos que reduzem o tempo de montagem, tais como o sistema “porta pronta” – em que toda a estrutura da porta já vem pronta para ser fixada no vão em obra, contando com batentes, guarnições, folha, dobradiças, maçaneta.
Nesse sentido, a indústria e o setor comercial têm um papel fundamental junto aos centros de treinamento profissionalizantes e universidades na difusão de conhecimento de novas técnicas, tecnologias e produtos que facilitem a vida dos profissionais envolvidos nesse importante ramo dentro da cadeia produtiva nacional.
É ainda sabido que o país já avançou em relação à qualidade de obra e dos métodos de construção e acabamentos, em especial àqueles mais tradicionalmente adotados pela nossa indústria da construção, no entanto ainda há um longo caminho a fim de garantir qualidade e padrão nas obras brasileiras, sejam elas causadas durante o projeto, a construção, a fiscalização ou até mesmo pelo mau uso ao longo da vida útil da edificação. Assim sendo inovações são essenciais dentro do sistema de produção do setor (ABDI, 2015).
Em relação ao processo de construção civil, assinale a alternativa correta.
Compreendemos que os componentes do edifício são a base para a construção. Para que possamos selecionar os componentes corretos, eles precisam:
Há dois conceitos importantes em relação aos componentes: modulação e industrialização. Em relação à modulação, ela pode ser definida como:
Em relação à industrialização, o processo trouxe benefícios para o campo da construção civil, sendo um deles:
A partir da industrialização, a fabricação modular teve seu início voltado à construção civil. Isto permite:
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